Querida

Como consequência de uma mensagem escrita em tinta de saudade, a surpresa da resposta

Imagina as respostas possíveis e nem se atreve a avançar. Suspira, e nas reticências que seguem a primeira palavra, faz uma pausa que quase lhe sustem a respiração e segura o momento.

Já o arrepio lhe levanta a cabeça, percorre-lhe as costas e lhe dá aquele incontrolável tremor nas pernas.

Mais ou menos banal, queria ler cada letra como viveu cada segundo que partilhou com ele, com uma vagarosa e interminável sede. Supunha a expressão nervosa com que ele lhe teria escrito, regista cada afirmação e responde mentalmente a cada pergunta. Conhecia-lhe a escrita, o tom e quem sabe, talvez ainda os desejos.

Não que ele lhos dissesse, mas antes esperasse que ela se lhe antecipasse na dádiva profunda de si mesma que sempre fazia sem hesitar e sem esperar reconhecimento, embora na verdade estivesse sempre à espera da palavra de  ternura que não vinha, sem que tivesse esclarecido se por desconhecimento ou quem sabe ? desinteresse.

Levou maquinalmente o copo à boca e bebeu. Soube-lhe a amargo, não pela bebida, mas pelo remorso da hesitação,  fel da ansiedade e da saudade que mesmo sem sentir, sentia com intensidade.

Bebeu mais um trago e o sabor agora era outro. A bebida aquecia-lhe o corpo, que não a alma. Apetecia-lhe de repente beber mais ainda. Fixa os olhos na fotografia dele, brinda às palavras e já lê os desejos como promessas. Não querendo esperar mais, espera. Pelo momento em que finalmente ao entardecer, lhe sentirá as palavras e o corpo na pele.

Serenamente iria devorá-lo de beijos e encostando-o a si poderia imaginar, pela saudade, o tempo em que o corpo másculo nela se entranhava procurando abrigo e saciando a sede, dizendo em vários tons de barítono, numa escala de arpejo crescente, ao ritmo da tesão: Que…riiii…daaaa..

O compasso final era composto a dois, numa sonoridade de beijos, resfolegar de respiração acelerada a que só a cascata do seu sémen que a inundava poderia acalmar até novo concerto desconcertado de amor.

 

Felícia

(Dedicado)


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