Carta para um amante

Meu querido,

Ao invés da procura, a nosso caminho cruzou-se num encontro quase impossível, uma conversa em que o acaso deixou que o tempo nos fosse revelando que mais que a sedução e o prazer em boas conversas, partilhávamos o prazer no prazer do outro.

Na nossa história, estás em Marte e eu na lua. Livres, sem expectativa ou plano, soubemos sempre que nunca serias meu e eu nunca seria tua.

A excitante impossibilidade levou-nos a uma franca sedução que nos envolveu desde a primeira palavra…

Seduziste-me quando, não te tendo, fizeste-me sempre sentir que tinha. E em cada conversa mais banal, em cada palavra que me escreveste, em cada imagem que desenhaste na minha cabeça ou em cada fantasia que nos dedicámos a realizar, não sendo, fui tua.

Relembro a surpresa das tuas primeiras frases, a tua paciência tão sedutora, do tom banhado de charme, do cuidado que emprestavas a cada frase que me escrevias e que dia após dia foi semeando em mim um calor que facilmente se transformou numa amizade envolvida em desejo bruto e carnal. Até hoje, a vontade que me provocas trespassa-me e tantas vezes me faz imaginar-te em mim.

Somando letras, separando palavras e nas frases multiplicando sons, dividimos a mais erótica imaginação. Com palavras cravaste-me no corpo o desejo das tuas mãos e alimentaste-me a alma com a fantasia de ter o teu corpo.

Não sabendo se te tenho agora fica a saudade de tudo o que tivemos e o prazer de cada segundo ter existido. Terminámos tantas vezes com um “já sabe a pouco”. E meu querido, para mim, ansiosa para te sentir, saboreando cada momento, soube sempre a pouco! Hoje sinto a falta do que não tivemos, do que não tocámos e não sentimos, do que não te fiz, mesmo quando cada palavra que escrevo te trás até mim. Mesmo quando é na memória do que me fizeste sentir, dar e receber que busco a inspiração que me faz querer dizer-te tudo o que quis de ti.

Cada vírgula me lembra o som da tua respiração. Cada boneco de ar envergonhado traz-me a memória de todas as vezes em que, no calor das palavras a vergonha quase nos atingia, seguindo-se a coragem em mil beijos desenhados.

Não sentindo a falta de te ter ao meu lado, sinto falta de te ouvir, de rir contigo, de imaginarmos, de partilharmos sem pudor os desejos mais inconfessáveis.

Sinto falta de explorares as minhas fantasias, de leres e criares os meus desejos, de ouvires a minha tesão. De acordar de manhã sentindo que te tive, mesmo não tendo.
Falta-me a tua palavra escrita, o som da tua voz, a imagem do teu corpo com prazer, do desafio de te fazer sentir toda a tesão que provocavas e libertavas em mim.

Sinto falta daquele segundo de desejo incontrolável, em que de olhos fechados imaginávamos posições e estavas aqui, em mim. Do teu ar nervoso que adorava transformar em expressão de prazer ou da forma como, apesar da distancia, me fazias querer chegar sempre mais até ti.

Ficam as palavras que nos aqueceram, os sons com que vibrámos e uma quase cedência à loucura de ir ter contigo, possuir-nos e concretizar tudo o que imaginámos fazer um ao outro.
Relembrando o prazer e sem qualquer lamento, fica um “talvez um dia”. Fica cada texto a lembrar-me as vezes em que fizeste o resto do mundo desaparecer e ficará sempre a fantasia de transformar o nosso mundo da Lua numa noite tão real. Sempre sabendo que tu em Marte, eu na Lua, nunca serias meu e eu nunca tua.


2 comentários:

  1. Pedro

    30 de Setembro de 2014 a 13:18

    Excelente! 🙂

  2. Antonio Morais

    3 de Outubro de 2014 a 19:41

    Gosto, mas o platonismo não é o meu favorito. Numa fase inicial, talvez, mas de todo em não.
    O escrito é um lamento de alma bem disfarçado, e poderíamos lembra a estórea do ciganito que diz à mãe:
    – Ah mãe, pastel de nata é tão bom !!!
    – Já comeste ??!!!!
    – Não,. mas já vi comer.

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